A Internacional Comunista, a sua dissolução e a luta internacional dos comunistas hoje

(Parte II/III)

Comissão internacional da Organização Comunista (Alemanha)

George Dimitrov

A reviravolta no VII Congresso Mundial em 1935

A avaliação errónea do VI Congresso Mundial e do programa de 1928 como de “esquerda sectária” é essencialmente uma consequência das decisões do último Congresso Mundial da Comintern, o VII, que se reuniu em 1935 e, em alguns aspetos, definiu o rumo para uma orientação oposta.

No VII Congresso Mundial, o Secretário Geral da Comintern, Georgi Dimitroff , fez o seu famoso discurso sobre a luta da classe operária contra o fascismo. Entretanto, a situação mundial tinha mudado. O fascismo alemão deixou de ser apenas um inimigo político entre os outros com os quais os comunistas alemães tiveram de lidar; tinha subido ao poder, desde o início de 1933, tinha esmagado o movimento operário alemão e especialmente o partido comunista em muito pouco tempo, e empurrara-os para a mais profunda ilegalidade. O fascismo alemão tinha de ser agora cada vez mais considerado como uma ameaça existencial à União Soviética. O Japão, que depois da Coreia anexou a Manchúria em 1931, e a Itália, que se estava a rearmar maciçamente e começaria a sua guerra colonial na Etiópia, alguns meses depois, também se estava a tornar cada vez mais agressiva. Enquanto nos anos anteriores a ameaça militar à União Soviética podia esperar-se que viria, por exemplo, da Grã-Bretanha, agora já não era possível ignorar que as potências fascistas do Eixo – Alemanha, Itália e Japão – se tinham tornado a principal ameaça para a URSS e também para o movimento comunista mundial.

Resistência francesa

Nesta situação, Dimitroff apelou a uma reorientação da luta dos comunistas contra o fascismo em ascensão e, neste contexto, uma mudança da política de alianças: agora, devia procurar-se também a aliança com os partidos burgueses não-fascistas. Procurava-se a cooperação com os partidos social-democratas no âmbito da frente unida, e “ninguém, nem pessoas, nem organizações, nem partidos favoráveis à frente unida da classe operária contra o inimigo de classe, deveria ser atacado”15. Isso significava que o “inimigo de classe” era apenas o fascismo, e a atitude da social-democracia em relação à frente unida, mas não em relação ao domínio do capital em geral, tornou-se o critério decisivo para saber se o os comunistas a deviam atacar ou não.

Mas Dimitroff foi ainda mais longe no seu discurso: “Os interesses da luta de classes do proletariado e o sucesso da revolução proletária tornavam imperativa a existência de um único partido do proletariado em cada país”16. Apesar da independência da burguesia e a orientação revolucionária ser necessária para isso, não foi especificado se a base ideológica desse partido deveria ser o marxismo-leninismo ou outra coisa. Também não se esclarecia como seria possível ganhar a social-democracia que alguns anos antes ainda tinha sido considerada – e com razão – como uma força decididamente contrarrevolucionária e antissocialista, de repente, para a revolução socialista. Em vez de trabalho da juventude comunista, agora haveria uma juventude amplamente “antifascista” e, nos EUA, até um partido de massas “antifascista” e não socialista foi concretamente sugerido aos comunistas17. As resoluções sobre a bolchevização dos partidos comunistas de 1924 e o programa de 1928, em que a independência do partido revolucionário e a sua posição frontal contra o oportunismo e a social-democracia foram, assim, fortemente relativizados, sem tal afirmar explicitamente.A participação comunista no governo no âmbito do “frente unida proletária” (ou seja, com a social-democracia) ou a “frente popular antifascista” (ou seja, com a social-democracia e outros partidos burgueses) foi agora também declarada necessária sob certas condições. Tais governos poderiam evoluir para uma “forma transitória” rumo ao socialismo. Mesmo que Dimitroff tenha declarado que não se devia entender isto como um “estágio intermediário democrático” ou como uma transição pacífica, ainda alimentou a esperança de alguns numa participação no governo burguês e numa transição gradual para o socialismo dentro do Estado burguês. Essa esperança não se cumpriu em lugar nenhum. A Comintern tem de ser criticada pelas suas palavras de ordem de frente”unida” ou “popular”, por alimentar ilusões na transição pacífica através da participação num governo burguês.

A nova orientação das alianças foi entendida mais como uma mudança de tática, não como uma nova estratégia. O programa e a estratégia de 1928 não foram revogados, pelo que formalmente continuaram a aplicar-se. No entanto, o foco da luta política dos comunistas era agora bem diferente, e não ficou explícito que as novas decisões eram apenas um ajustamento tático temporário diante da ameaça fascista à sua existência. Tornou-se possível, no entanto, manter o essencial das diretrizes da política da Frente Popular mesmo para além da Segunda Guerra Mundial e o esmagamento militar do fascismo18. O facto é que a rejeição da participação no governo, além de casos muito raros, deve ser uma questão de princípio para o partido comunista, assim como a posição fundamental contra a social-democracia. Durante a aliança “tática”, no entanto, já não era considerada como principal. A diferença decisiva aqui não é, como foi muitas vezes criticado por parte dos trotskistas, se os comunistas contavam com a frente popular (aliança com partidos social-democratas e outros partidos burgueses) ou simplesmente com a frente unida (aliança apenas com os partidos social-democratas) para a social-democracia, também, estava na sua natureza de classe, de um partido do burguesia defendendo a exploração capitalista. A diferença decisiva na estratégia está em saber se a frente unida com os trabalhadores com pontos de vista burgueses (social-democratas, religiosos, etc.) é procurada”em baixo”, ou seja, sem e contra as lideranças dos seus partidos, ou se os comunistas entram em colaboração com forças políticas burguesas, ou seja, em última instância, com a burguesia.

A nova orientação da Comintern também se baseou numa mudança de compreensão do próprio fascismo. A famosa definição de Dimitroff do fascista no poder como “a ditadura aberta e terrorista dos elementos mais reacionários, chauvinistas, mais imperialistas do capital financeiro” afastava-se claramente do entendimento anterior do fascismo como ditadura dos monopólios como um todo. A distinção da burguesia entre fascista e supostamente “antifascista” possibilitou agora também uma política de cooperação com estes últimos.

O Comintern cometeu aqui o erro de omitir o facto de que o fascismo resultou das leis do modo de produção capitalista como um todo e, finalmente, teve de contar com toda a burguesia como forma de governo. Pois mesmo que seja possível que no Estado burguês certas secções da classe capitalista possam preferencialmente afirmar os seus interesses, o Estado, no entanto, assegura a propriedade e, portanto, o domínio de toda a classe. Isto não é diferente no fascismo e, por isso, no estado fascista a burguesia como um todo está no poder e deve ser combatida como um todo pelos comunistas.

O VII Congresso Mundial foi também um ponto de viragem no desenvolvimento da Comintern. Os comunistas enfrentaram o enorme desafio de encontrar uma abordagem adequada perante perigosas ditaduras fascistas. O artigo de Dimitroff, que dominou todo o congresso, mostra muito claramente o esforço para fazer certas concessões táticas, por um lado, para atrair as mais amplos forças possíveis à luta contra o fascismo, mas, por outro lado, para salvaguardar fundamentalmente o objetivo da revolução proletária. Uma e outra vez afirma-se que a revolução é uma necessidade, uma e outra vez foram postas condições para os compromissos feitos com as forças burguesas – embora, a maior parte as condições fossem irrealistas de se cumprir (tais como a luta conjunta contra a ofensiva do capital ou, no contexto de um partido proletário unido, a luta conjunta pela ditadura do proletariado) e que, portanto, inevitavelmente tinham de colocar o dilema de ou fazer mais concessões à política burguesa ou abandonar o esforço para formar uma aliança.

A situação em que se encontrava o movimento comunista em 1935 deve ser levada em conta: o DKP, um dos mais importantes partidos da Comintern tinha sido quase completamente destruído pelos fascistas em pouquíssimo tempo. Uma guerra contra a Alemanha e o Japão teria sido uma ameaça imediata à existência da União Soviética. Não reagir a essas mudanças não teria sido uma opção. No entanto, as decisões do VII Congresso Mundial, na forma em que foram tomadas e justificadas, estavam fadadas a incentivar o surgimento de falsas conceções estratégicas.

Os anos após o VII Congresso Mundial

Nos anos seguintes, a ameaça fascista cresceu constantemente. Em Espanha, a guerra da República contra os fascistas começou um ano depois com o golpe fascista dos militares, que a República perdeu apesar do apoio em massa da União Soviética e da Comintern. No Leste Asiático, a II Guerra Mundial eclodiu já em 1937 com a invasão japonesa da China desocupada, e em 1938-39 houve repetidas batalhas entre o Exército Vermelho e o Exército Imperial Japonês na fronteira soviético-japonesa. A Alemanha nazi, por sua vez, anexou a Áustria e os territórios dos Sudetas e, em seguida, subjugou o resto da República Checa.

Guerra Civil Espanhola

Até 1939, a União Soviética tentou por todos os meios conquistar a Grã-Bretanha e a França para um sistema de segurança coletiva, a fim de impedir a expansão agressiva da Alemanha. Mas os governos britânico e francês esperavam usar os fascistas alemães como um aríete contra a União Soviética, e para isso, até atiraram a sua aliada Checoslováquia para os braços Hitler em vez de aceitar a oferta soviética de defender conjuntamente a Checoslováquia. A União Soviética prosseguiu as negociações com a mais alta prioridade e seriedade, enquanto os lados francês e britânico as prosseguiram apenas como uma farsa e como uma tática para ganhar tempo, sem intenção de realmente concluir um acordo. Assim, forçaram a União Soviética, finalmente após anos de esforços inúteis, a abandonar as suas táticas e concluir um tratado de não-agressão com a Alemanha, a fim de atrasar a guerra com a Alemanha nem que fosse por um curto período de tempo.

O Tratado de Não-Agressão, que, hoje, na propaganda anticomunista, é chamado “Pacto Hitler-Stalin” distorcendo completamente os factos, é interpretado como uma “aliança de ditadores totalitários” mas foi uma medida de emergência que dificilmente poderia ter sido evitada e deu à União Soviética mais alguns valiosos meses para se preparar para a guerra. Os partidos comunistas em muitos países, no entanto, enfrentaram desafios difíceis para explicar e justificar a nova política externa da União Soviética, depois de anos a defender a necessidade de combinar todas as forças contra o fascismo. Deve-se ressaltar, no entanto, que a Comintern manteve a sua política antifascista mesmo após o acordo. Por exemplo, o diário de Dimitroff mostra que, em 1940, após a invasão alemã da Jugoslávia e da Grécia, o Comintern instruiu os PC para organizar propaganda contra a ocupação alemã e organizar a resistência armada. O PC francês também foi auxiliado na organização da resistência à ocupação alemã19. Se por vezes se afirma que, após o “Pacto Hitler-Estaline” e até à invasão alemã da União Soviética em Junho de 1941, a União Soviética e os partidos comunistas abandonaram entretanto a sua oposição ao fascismo, isso não corresponde aos factos.

O Tratado de Não-Agressão marcou, assim, não só uma reviravolta na política externa soviética, mas também na linha política da Comintern. A palavra de ordem da Frente Popular foi abolida. Enquanto a Comintern já tinha procurado a cooperação com as forças burguesas contra o fascismo, agora considerou que “a guerra atual é imperialista e injusta. A burguesia de todos os Estados em guerra deve ser responsabilizada por isso. Esta guerra não pode ser apoiada pela classe trabalhadora desses países, para não mencionar os seus partidos comunistas. (…) Esta guerra mudou radicalmente a situação: a divisão dos Estados capitalistas entre fascistas e democráticos já não está em vigor. Por isso, é preciso mudar de tática. A tática do partido comunista dos países beligerantes neste momento é denunciar o seu caráter imperialista, fazer com que os deputados comunistas votem contra os créditos de guerra, dizer às massas que a guerra não dará nada além de privação e sofrimento.” 20.

A nova orientação continha avaliações corretas na sua essência, a saber, que se tratava de uma guerra entre países imperialistas e que a burguesia da França e da Grã-Bretanha tinha desempenhado um papel importante na sua concretização – sobretudo através da sua política de apaziguamento e apoio de facto à Alemanha fascista na luta contra a República Espanhola e como aríete contra a União Soviética. Por outro lado, o perigo que as potências fascistas do Eixo representavam para o comunismo mundial parecia ser subestimado, porque a orientação da Comintern poderia ser entendida como significando que era irrelevante para o movimento comunista qual o lado que venceria a guerra.

Em 22 de junho de 1941, as tropas da Wehrmacht alemã cruzaram a fronteira com a URSS numa vasta frente. O Tratado de Não-Agressão foi quebrado pela Alemanha e começou a Grande Guerra Patriótica, a parte mais sangrenta da Segunda Guerra Mundial na Europa, que finalmente terminou com a aniquilação militar do fascismo. A Comintern estava agora confrontada com a tarefa de organizar a luta dos partidos comunistas contra a agressão alemã em todos os países beligerantes. Nos países ocupados, isso significou fazer avançar a resistência organizada à ocupação. Em quase todos os lugares, os comunistas eram a força maior, mais ativa, e mais dinamizadora da resistência antifascista. Na Itália, Jugoslávia, França, Grécia, Albânia, Polónia, China, Coreia, Indochina e nas partes ocupadas da União Soviética, entre outras, foram formadas unidades guerrilheiras sob a liderança comunista, que nos anos seguintes conseguiram construir um apoio popular em massa e desencadear uma guerra efetiva contra os ocupantes fascistas, infligindo-lhes perdas constantes, apresando grandes contingentes de tropas e interrompendo repetidamente as suas linhas de abastecimento. Os comunistas de várias nacionalidades e continentes fizeram enormes sacrifícios no processo e realizaram o inimaginável, travando a luta contra os fascistas nas condições mais difíceis e na mais profunda ilegalidade, o que na maioria dos casos os sociais-democratas e outras forças burguesas não quiseram ou não puderam fazer.

Soldados soviéticos

A decisão de dissolver o Comintern

Durante a guerra, a Comintern tinha perdido importância na prática, já que muitos partidos comunistas agora tinham de trabalhar na ilegalidade, a própria União Soviética estava envolvida numa luta de vida ou morte e, portanto, as estruturas regulares da Internacional já não funcionavam como antes. Mas no VII Congresso Mundial já tinha havido uma mudança na relação entre a organização mundial e as suas secções nacionais. Já naquela época, a Comissão Executiva da Internacional Comunista (CEIC) escrevia no seu relatório que se tratava de auxiliar “os partidos comunistas a fazer uso da sua própria experiência, bem como da experiência do movimento comunista mundial, evitando, no entanto, a aplicação mecânica da experiência de um país para outro e a substituição de métodos estereotipados e formulações gerais, por análises marxistas concretas21. Foi ainda afirmado que a CEIC deve “proceder a partir da situação concreta e das condições específicas existentes em cada país em particular e, em regra, evitar a intervenção direta em questões de organização interna dos partidos comunistas”. 22. Assim, a Comintern já tinha adotado, em certa medida, a lógica de que a luta de classes é determinada sobretudo pelas condições nacionais e que os partidos comunistas dos vários países já saberiam melhor o que fazer. Já o VII Congresso Mundial, questionou implicitamente a necessidade da Internacional. Portanto, a decisão de se dissolver em 1943, não veio do nada.

Nos relatos burgueses, é comum retratar a decisão como uma concessão da liderança soviética aos Aliados ocidentais para consolidar a aliança da coligação anti-Hitler no auge da Grande Guerra Patriótica. Este foi certamente um fator motivador, como mostra a resposta de Stalin ao repórter da Reuters em Moscovo em 28 de maio de 1943: “A dissolução da Internacional Comunista é apropriada e oportuna porque facilita a organização do ataque comum de todas as nações amantes da liberdade contra o inimigo comum – o hitlerismo. (…) Denuncia a mentira dos hitleristas no sentido de que “Moscovo” supostamente pretende intervir na vida de outras nações e “bolchevizá-las”. (…) Facilita o trabalho dos patriotas de todos os países para unir as forças progressistas dos seus respetivos países, independentemente do seu partido ou fé religiosa, num único campo de libertação nacional – para desenvolver a luta contra o fascismo.” 23 Assim, Estaline declarou abertamente que, durante a luta comum contra o fascismo, não poderia pôr-se a questão de fazer avançar a revolução nos países capitalistas ocidentais.

Esta orientação é, em primeiro lugar , compreensível numa situação de luta de vida ou de morte – uma derrota do Exército Vermelho pela Alemanha nazi não só significaria um sofrimento incomensurável, mas também teria atrasado enormemente o processo revolucionário mundial. Mas mais problemática foi a criação da noção de que havia um campo “amante da liberdade” que incluía, além da União Soviética, alguns dos Estados imperialistas mais poderosos, que no passado tinham cometido inúmeros crimes bárbaros e genocídios, reprimido brutalmente os comunistas e o movimento operário, etc. Isso abriu caminho para uma posterior política oportunista de aliança com as forças burguesas, mesmo quando a frente contra as potências capitalistas da antiga “coligação anti-Hitler” (1946/47) foi retomada.

No entanto, o relato de que a dissolução do Comintern foi uma concessão aos aliados capitalistas ignora o fato de que já havia discussões internas nos principais círculos da Internacional desde 1941 sobre se a organização não estava obsoleta – numa época, isto é, quando a União Soviética ainda não estava em guerra, quanto mais numa aliança com os EUA e a Grã-Bretanha. Assim, já em abril de 1941, Estaline manteve conversas por correspondência com Dimitroff e os líderes dos partidos comunistas francês e italiano, Thorez e Togliatti, nas quais foi unanimemente afirmado que os PC tinham de ser independentes, tinham de ter os seus próprios programas, e não deveriam “olhar por cima do ombro para Moscovo”. 24 Ainda antes, em novembro de 1940, o Partido Comunista dos EUA tinha-se se retirado da Comintern por razões táticas. Obviamente, nenhuma consideração tática de aliança da política externa soviética foi decisiva nesses eventos, mas sim a ideia, já desenvolvida no VII Congresso Mundial, de que, devido às diferentes condições nacionais, seria contraproducente uma organização comum dos comunistas.

Era, portanto, para ser levado a sério, e certamente de forma não desonesta, quando o Presidium da CEIC, na sua decisão de dissolução, em 15 de maio de 1943, formulou: “Mas muito antes da guerra tornou-se cada vez mais claro que, na medida em que a situação interna e internacional de cada país se tornava mais complicada, a solução dos problemas do movimento operário de cada país através de algum centro internacional encontraria obstáculos insuperáveis. As profundas diferenças nos caminhos históricos de desenvolvimento de cada país do mundo, o caráter diverso e mesmo a contradição nos respetivos ordenamentos sociais, a diferença no nível e na taxa do seu desenvolvimento social e político e, finalmente, a diferença no grau de consciência e organização dos trabalhadores condicionaram também os vários problemas que a classe trabalhadora de cada país enfrenta. Todo o curso dos acontecimentos do último quarto de século, bem como as experiências acumuladas da Internacional Comunista, provaram de forma convincente que a forma organizativa de união dos trabalhadores escolhida pelo Primeiro Congresso da Internacional Comunista, que correspondia às necessidades do período inicial de renascimento do movimento operário, cada vez mais sobreviveu na proporção do crescimento deste movimento e da crescente complexidade dos problemas em cada país, e que esta forma se tornou até um obstáculo para o fortalecimento dos partidos dos trabalhadores nacionais”.25

Churchill,Roosevelt e Estaline na Conferência de Ialta

A conexão substantiva com o VII Congresso Mundial era evidente, enfatizando a diversidade de tarefas nos diferentes países e continuando a propagar a política da frente popular de todas as forças antifascistas nos países não fascistas.

Este segundo motivo para a decisão de dissolver a Comintern pode ser considerado como o mais decisivo, uma vez que, ao contrário do motivo de fazer concessões ao Ocidente na guerra, já tinha sido indicado desde 1935 e, desde então, já tinham sido dados passos no sentido da dissolução da Comintern (fortalecendo a ação autónoma dos PC e a retirada do PC dos USA). Isto reflete um repensar fundamental por parte dos líderes do movimento comunista mundial, que já há muito não assumiam a necessidade de um centro dirigente.

A dissolução da Internacional foi discutida num pequeno círculo de liderança, o que dificilmente seria possível de outra forma nas condições da Guerra Mundial, e de forma alguma foi imposta aos partidos comunistas, mas foi bem recebida por muitos deles. Oficialmente, mesmo todas as secções nacionais concordaram com a decisão da dissolução, e nenhuma objeção foi levantada por nenhuma delas. Muitos partidos comunistas justificaram-no mesmo muitos anos depois26.

Como exemplo, citamos Palmiro Togliatti, que mais tarde formulou a visão de que era “absurdo que eles pensassem que poderiam exercer, a partir de um único centro, uma verdadeira ação de liderança. Os partidos comunistas tinham de se tornar pela sua própria força um fator político no seu país e, assim, ser capazes de caminhar de forma independente, em função do curso dos acontecimentos, pontos de viragem, sucessos e fracassos. Assim, já estava implícita nas decisões do VII Congresso, de certa forma, a decisão de dissolução tomada em 1943, quando foi declarado abertamente que a forma centralizada anterior de organização já não correspondia à situação e ao estado do movimento. “27 Mao Tsé-tung também saudou a decisão de a dissolver28 e Zhou Enlai, como primeiro-ministro da República Popular da China, declarou mais tarde: “Era necessário estabelecer a Internacional Comunista e também era necessário dissolvê-la“. 29

15 G. Dimitrov 1935: “A ofensiva fascista e as tarefas da Internacional Comunista na luta da classe operária contra o fascismo”. Relatório Principal apresentado no VII Congresso Mundial da Internacional Comunista. Disponível em: https://www.marxists.org/reference/archive/dimitrov/works/1935/08_02.htm

16 Ibidem.

17 Ibidem.

18 E isso, embora o slogan da Frente Popular tenha sido retirado novamente em 1939, após o tratado de não-agressão com a Alemanha. Na verdade, no entanto, a política do Comintern após a invasão alemã da União Soviética foi novamente baseada na política da Frente Popular.

19 Georgi Dimitrov 2003: “O Diário de Georgi Dimitrov, 1933-1949”, Universidade de Yale, pp. 136, 147, 155.

20 “ECCI Secretariat Directive on the Outbreak of War”, 8 de agosto de 1939. Disponível em: https://www.revolutionarydemocracy.org/rdv6n2/dimitrov.htm

21 “Resolução do Sétimo Congresso Comintern sobre o Relatório da ECCI”, 1 de agosto de 1935. Disponível como trechos em Degras, Jane. Internacional Comunista: Documentos, 1919-1943 (Volume 3), pg. 350-355. Routledge, 2014

22 Citado na “Resolução do presidium da ECCI recomendando a dissolução da Internacional Comunista”, 15 de maio de 1943. Disponível online: https://www.marxists.org/history/international/comintern/dissolution.htm.

23 J. Stalin 1943: “A dissolução da Internacional Comunista. Resposta ao Correspondente de Reuter”. Disponível online: https://www.marxists.org/reference/archive/stalin/works/1943/05/28.htm

24 Dimitrov 2003, p. 155n.

25 25 “Resolução do presidium da ECCI recomendando a dissolução da Internacional Comunista”, 15 de maio de 1943.

26 “Declaração do Presidium da ECCI sobre a Dissolução da Internacional Comunista”, 8 de julho de 1943. Disponível online em: http://ciml.250x.com/archive/comintern/dissolution_1943.html

27 P. Togliatti 1949: “Alcuni problemi della storia dell’Internazionale comunista” (Alguns problemas na história da Internacional Comunista). Disponível online em: https://www.associazionestalin.it/IC_5_togliatti.html.

28 Mao Tse-tung: “O Comintern há muito deixou de se intrometer nos nossos assuntos internos” (26 de Maio de 1943). Disponível online em: https://www.marxists.org/reference/archive/mao/selected-works/volume-6/mswv6_36.htm

29 Zhou Enlai 1960: “A Internacional Comunista e o Partido Comunista Chinês”. Disponível online em: http://www.marx2mao.com/Other/CI60.html.

https://mltoday.com/the-communist-international-its-dissolution-and-the-international-struggle-of-communists-today/ (24.03.24)

Foto 1: https://vermelho.org.br/2020/07/19/george-dimitrov-lider-historico-a-luta-contra-o-nazifascismo/

Foto 2: https://historiaemrede.medium.com/uma-trag%C3%A9dia-francesa-colaboracionismo-e-resist%C3%AAncia-na-fran%C3%A7a-de-vichy-46a1b546e84f

Foto 3: https://ensina.rtp.pt/explicador/a-guerra-civil-de-espanha/

foto 4: https://br.rbth.com/historia/85410-as-5-vitorias-mais-importantes-dos-sovieticos-na-segunda-guerra

foto 5: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/essencial-ou-dispensavel-entenda-o-papel-da-uniao-sovietica-na-2a-guerra-mundial/