Intervenção sobre a Conspiração de Trotsky na Comintern para o ICSS de Oakland – 20 de Outubro de 2024 (Parte II/II)

Intervenção sobre a Conspiração de Trotsky na Comintern para o ICSS de Oakland – 20 de Outubro de 2024 (Parte II/II)

Grover Furr

Como saber se um réu foi condenado injustamente?

É necessário localizar e estudar as PROVAS apresentadas pela acusação no julgamento.

Estudámos muitos relatórios de “reabilitação” da era Khrushchev e Gorbatchov. Nunca encontrámos um único que fornecesse provas da inocência dos acusados — ainda assim, são aceites como “prova de inocência” por anticomunistas e trotskistas.

No estudo da história não existe “credibilidade” automática: todas as provas devem ser analisadas com ceticismo rigoroso.

A Necessidade de Objetividade

Todos temos preconceitos. Mas é possível aprender a ser-se objetivo em qualquer disciplina, seja física ou história.

Objetividade é uma prática de “desconfiança de si próprio”: é preciso treinar-se para reconhecer e questionar as próprias ideias pré-concebidas. Deve ler-se com particular atenção as provas que desafiem as nossas crenças.

Como Sherlock Holmes disse em A Study in Scarlet:

“É um erro grave teorizar antes de ter todas as provas. Isso prejudica o julgamento.”

Resumidamente: recolhe primeiro os factos antes de formular hipóteses. E, se os factos não confirmarem a hipótese, abandona-a — especialmente se essa hipótese corresponder às tuas ideias prévias.

A verdadeira finalidade da maioria dos estudos sobre a história soviética não é encontrar a verdade, mas optar por “mentiras convenientes” em vez de “factos desconfortáveis” para que se chegue a conclusões politicamente aceitáveis.

O “paradigma anti- Estaline ” é tão poderoso que a maioria acredita que “onde há fumo, há fogo”.

Isto está errado. Nada substitui a evidência.

Tortura e Provas Históricas

No nosso livro, examinámos também a questão da tortura. Estudámos A.I. Langfang, o investigador no caso de Pyatnitsky. Vladimir demonstrou de forma brilhante que Langfang não era um dos torturadores de Nikolai Yezhov ou falsificador de confissões.

Campanhas de Demonização

Durante os tempos de Khrushchev (1953-1964) e Gorbatchov (1985-1991), o Estado soviético dedicou recursos à criminalização de Estaline.

Os documentos de “reabilitação” mostram isso claramente. Não encontraram quaisquer provas genuínas de que Estaline tenha falsificado processos.

Pelo contrário, documentos recentemente desclassificados tendem a ilibar Estaline.
Por exemplo, a transcrição do julgamento de 11 de Junho de 1937 dos conspiradores militares no “Caso Tukhachevsky” foi desclassificada em 2018.

Sempre esteve nos arquivos soviéticos — ou seja, Khrushchev e seus sucessores sabiam que Tukhachevsky e os outros eram de facto culpados de conspirar com Hitler e de planearem derrubar o governo soviético. Contudo, Khrushchev e todos os líderes seguintes insistiram na narrativa falsa de que Estaline os “incriminou”!

Em Janeiro de 2021, Vladimir, eu e o nosso colega sueco Sven-Eric Holmström publicámos um livro sobre o Caso Tukhachevsky. Há tantas provas de fonte primária da sua culpa que nem conseguimos incluir todas!

Falsificações Históricas

Por vezes, documentos são publicados em várias versões contraditórias — falsificações para apoiar versões “oficiais”.Exemplos claros disso são os documentos falsificados sobre a morte do director teatral judeu Solomon Mikhoels e sobre a alegada culpa soviética no Massacre de Katyn.

Publicámos livros sobre ambos: Stalin Exonerado – Fact-Checking the Death of Solomon Mikhoels (2023) e The Mystery of the Katyn Massacre: The Evidence, The Solution (2018).

Conclusão

Todas as conclusões históricas são provisórias. Com novas provas, devemos estar preparados para corrigir ou abandonar conclusões anteriores. A chave é estarmos sempre dispostos a questionar os nossos próprios preconceitos, evitando o “viés de confirmação”, que é exatamente o erro cometido por anticomunistas mainstream e trotskistas.

Heinz Neumann e a Conspiração

Heinz Neumann, figura de destaque do Partido Comunista da Alemanha, foi condenado por participar na conspiração Direita-Trotskista na Comintern e foi executado a 26 de Setembro de 1937.

Durante muito tempo, Neumann foi tido como inocente, em grande parte devido aos escritos da sua esposa Margarete Buber-Neumann, que se tornou anticomunista após a Segunda Guerra Mundial. Contudo, até nas suas memórias (Sob Dois Ditadores) existem indícios de ligações suspeitas.

Quando foi preso, Neumann aconselhou a esposa a sair da URSS e a contactar Friedrich Adler, conhecido pela sua atividade anti-soviética. Com base nas provas hoje disponíveis, Neumann esteve longe de ser inocente. Nomeia Pyatnitsky dezenas de vezes nos interrogatórios e numa longa declaração de 1 de Novembro de 1937, clarificando também o seu próprio papel na conspiração Direita-Trotskista na Comintern. No nosso livro, analisámos os trechos mais importantes dessas declarações.

Pyatnitsky e Trotsky

Nas suas declarações de confissão, Pyatnitsky afirmou ter recebido ordens de Trotsky através de terceiros. Pyatnitsky estava plenamente consciente de que Trotsky negociava com a Alemanha fascista e com o Japão militarista para fomentar uma insurreição contra o governo soviético. Sabia que o objectivo da conspiração era restaurar as relações capitalistas na URSS.

O principal papel de Pyatnitsky na conspiração era cultivar os seus contactos na Comintern enquanto se preparava para derrubar o governo soviético através da oposição. Os contactos de Trotsky com os alemães eram essenciais para este propósito, já que os oposicionistas tinham perdido qualquer esperança de destituir sozinhos a liderança de Estaline.

Trotsky confiava em Pyatnitsky para o ajudar a roubar fundos do orçamento da Comintern para os enviar para Trotsky. Isto totalizava 20.000 rublos em ouro — cerca de 15.000 dólares americanos por ano, durante três anos. Este dinheiro, destinado a apoiar revolucionários em todo o mundo, foi desviado por Pyatnitsky e companhia para financiar a colaboração de Trotsky com nazis e fascistas e o seu trabalho de sabotagem contra o Exército Vermelho e a economia soviética!

Pyatnitsky declarou-se culpado no seu julgamento. A lei soviética tinha uma disposição semelhante à Quinta Emenda dos EUA: no julgamento o réu podia recusar-se a confirmar os seus depoimentos anteriores, incluindo confissões de culpa feitas durante a investigação. Nesse caso, a acusação teria de se basear noutras provas.

Os documentos de “reabilitação” da era Khrushchev e posteriores afirmam que alguns réus recusaram confirmar as suas confissões em tribunal. O próprio Nikolai Yezhov, indiscutivelmente responsável por dezenas de milhares de mortes de inocentes, fez isso.

O réu podia recusar confirmar as suas próprias confissões, mas não podia impedir o testemunho de outros contra ele.

No caso de Yezhov — cujo processo e ata de julgamento continuam não desclassificados — o seu ex-subordinado Mikhail Frinovsky estava disponível para testemunhar contra ele, além de muitos outros testemunhos. No caso de uma conspiração sem provas materiais — como documentos — isto significava as declarações das testemunhas.
A acusação contra Pyatnitsky enumera treze homens que testemunharam contra si, além de “outros”.

O testemunho de tantos co-conspiradores constituía um vasto corpo de provas contra Pyatnitsky. Refutá-lo em julgamento seria inútil. Negar também seria fútil. Simplesmente havia demasiadas provas contra si. Nas suas últimas palavras no julgamento de 13 de Março de 1938, Nikolai Bukharin afirmou:

“Falarei agora de mim próprio, das razões para o meu arrependimento. Naturalmente, deve admitir-se que as provas incriminatórias [uliki] desempenham um papel muito importante… O essencial não é o arrependimento, nem o meu arrependimento pessoal em particular. O Tribunal pode emitir o seu veredicto sem ele. A confissão do acusado não é essencial.” (pp. 777-778)

Bukharin tinha razão! Existia um número enorme de acusações contra ele feitas por outros membros da conspiração Direita-Trotskista. Bukharin escreveu dois apelos eloquentes contra a sua sentença de morte, onde reconheceu que pelos seus crimes “deveria ser fuzilado dez vezes”.

Pyatnitsky também apelou à clemência no julgamento.

Falsificação da História do Período de Estaline

O nosso relato das conspirações oposicionistas é fortemente apoiado pelas provas tornadas disponíveis após o fim da União Soviética em 1991. Contudo, apesar das provas, é largamente rejeitado pelos académicos mainstream.

Desde a ascensão de Nikita Khrushchev, após a morte de Estaline, a história soviética tem sido dominada por mentiras sobre Estaline. Khrushchev iniciou uma campanha para acusar Estaline de ter eliminado cruelmente líderes do Partido nos anos 1930 e 1940, intensificando essa campanha após o XXII Congresso do Partido, em Outubro de 1961.

Khrushchev liderou a URSS até ser afastado em Outubro de 1964. Sob Brezhnev (1964-1982), Andropov (1982-1984) e Chernenko (1984-1985), os ataques a Estaline cessaram quase totalmente — mas as mentiras da era Khrushchev nunca foram oficialmente retratadas.

Após assumir a liderança em 1985, Mikhail Gorbatchov lançou uma campanha de falsificação histórica e de demonização de Estaline ainda mais virulenta do que a de Khrushchev. As falsificações de Khrushchev e Gorbatchov foram o “maná do céu” para os anticomunistas pró-capitalistas e para o movimento trotskista.

Durante estas épocas, historiadores soviéticos não podiam apresentar provas para sustentar os seus ataques — os arquivos do período de Estaline estavam fechados até aos investigadores de confiança do Partido. Mesmo assim, essas mentiras foram aceites como verdade.

Depos de 1991, as autoridades russas começaram a publicar documentos dos antigos arquivos soviéticos. Hoje, temos “montanhas” de documentos sobre praticamente todas as áreas da vida soviética dos anos 1920 e 1930.

Durante 25 anos, Vladimir Bobrov e eu temos procurado provas de qualquer crime de Estaline. Não encontrámos nenhuma. Apesar disso, as mentiras sobre Estaline e sobre a história soviética continuam a dominar a narrativa histórica.

Desde a Revolução Bolchevique que a historiografia soviética serviu primariamente para propaganda anticomunista e apenas secundariamente para a descoberta da verdade.

No movimento comunista mundial, o “Discurso Secreto” de Khrushchev teve de ser aceite por todos os que quisessem permanecer nos seus partidos. O movimento trotskista, em declínio, recebeu nova vida através das mentiras de Khrushchev.

Assim, a demonização de Estaline passou a dominar não só a historiografia académica como também a perceção histórica dos comunistas em todo o mundo durante quase 70 anos.


Esta representação falsa e demonizada criou raízes profundas, desde estudos académicos a livros populares, manuais escolares e meios de comunicação social.

Alguns comunistas, como os dos partidos chinês e albanês, romperam com Moscovo ao rejeitar a tendência anti-Estaline. Mas, naquela época, ninguém tinha provas para apoiar a suspeita de que Khrushchev e Gorbatchov estavam a mentir.

Hoje essas provas existem.

E quanto ao futuro?

O processo de desmantelamento das mentiras sobre Estaline e a União Soviética estalinista levará anos. Anticomunistas e trotskistas continuarão a promover estas falsidades porque estas são essenciais para as suas carreiras académicas e para a propaganda pró-capitalista e trotskista. Em contraste, nós estamos comprometidos com a descoberta da verdade, estudando as provas com rigor e objetividade.

Sabemos que quem vê a verdade como uma ameaça nos chamará “estalinistas” e tentará ignorar a nossa investigação. Não somos “estalinistas”. Mas existem muitas pessoas, em todos os países, famintas pela verdade sobre o sucesso e os fracassos da União Soviética de Estaline.

Elas acolhem os resultados da nossa investigação — e nós acolhemos os seus comentários e críticas.

Fonte: Talk on Trotsky

Fotos: https://super.abril.com.br/historia/quem-foi-leon-trotsky/; https://bomdia.eu/estaline/;https://pt.wikipedia.org/wiki/Josef_Stalin;

https://www.estadao.com.br/internacional/dia-da-vitoria-na-russia-como-putin-usa-vitoria-contra-os-nazistas-para-alimentarnacionalismo

1

1